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O filme os Pinguins do Papai e a Teoria do Apego


O filme “Os Pinguins do Papai”, a mais nova produção estrelada por Jim Carrey, traz às telonas não somente entretenimento e boas risadas, mas uma infinidade de questões sobre a relação familiar, especialmente entre pais e filhos. O personagem principal chama-se Popper e é o papai. A primeira cena retoma lembranças da sua infância: em um restaurante o menino Popper tenta chamar a atenção de seu pai que o ignora e não lhe dá a mínima atenção. O adulto Popper, invariavelmente, torna-se um reflexo da falta de afeto de seus cuidadores, principalmente de seu pai que era um homem viajante, desbravador de outros mundos, mas néscio no mundo interno de seu filho.

É sabido que uma criança não sobrevive sem uma alimentação adequada. O que não é levado em consideração por grande parte dos adultos é que o apego e o vínculo afetivo são tão importantes quanto os alimentos e a segurança física. Bowlby (1951) é pioneiro e idealizador da teoria do apego, conduzindo seus estudos e interesses pelos padrões reais de interação da família envolvida no desenvolvimento saudável e patológico do indivíduo. Vamos identificar um pouco dessa teoria no referido filme. Ainsworth (1989) define vínculo afetivo como um laço de duração relativamente longo, no qual o parceiro é importante como um indivíduo único e não é intercambiável com nenhum outro. Em um vínculo afetivo há um desejo de manter proximidade com o outro. O apego é uma subvariedade de vínculo afetivo, no qual o senso de segurança de uma pessoa está ligado ao relacionamento. Podemos ver durante o filme a mudança desses dois conceitos na vida do personagem de Jim Carrey.

O Sr. Popper é um adulto bem sucedido, bonito e rico. Tem todas as características aparentes de ser bem sucedido no conceito de sucesso para muitas pessoas. Trabalha no que faz muito bem, tem um enorme apartamento e um alto rendimento mensal. No entanto, é sozinho, ao ponto de o despertador tocar na segunda-feira e ele acordar aliviado e animadíssimo porque enfim acabou a tortura do final de semana. Divorciado, pode pegar os seus dois filhos em finais de semana alternados, no entanto seus filhos evitam essa estada. Observa-se em algumas cenas que o apego dos filhos em relação ao pai é inexistente e o vínculo afetivo com os filhos, precário. Vários aniversários esquecidos, promessas não cumpridas e ausência em momentos críticos denunciam a relação estabelecida entre Pippi e Janie e o papai Popper que não consegue demonstrar afeto. Por exemplo, em uma cena recebe um abraço e diz que não é uma árvore em extinção e não precisa daquele tipo de coisa.

Segundo Biringen (2000), estudos das interações entre pai-filho sugerem que um ingrediente crucial para um apego seguro é a disponibilidade emocional da parte do cuidador. Isso pode refletir até a vida adulta. Pesquisas recentes (Bauminger, Finzi-Dottan, 2008) afirmam que aqueles que foram classificados como seguramente apegados na infância têm mais amigos íntimos. No caso do personagem principal do filme isso vai ficando mais claro a cada cena, Popper um homem solitário e insensível. Alguns estudos mostram que homens e mulheres que eram seguramente apegados a seus pais são mais sensíveis às necessidades do outro, incluindo aqui filhos e companheiros (Mikulincer e Shaver, 2005).

O modelo funcional interno de apego do papai do filme pode ser classificado como preocupado ou desorientado. Apresentava raiva de seu pai e comportamentos confusos e ambivalentes, mas, ainda assim, empenhados. Isso ficou claro quando o presente post-mortem de seu pai chegou. No testamento dizia que era um suvenir, mas na verdade ele se referia a um pingüim não daqueles que se põem na geladeira, mas um animal que necessita de alimento, cuidado e porque não dizer afeto. As cenas são engraçadíssimas, principalmente depois da chegada de mais cinco companheiros do ártico. Um apartamento impecável, decorado de forma minimalista e ordenada que abriga um sujeito detalhista com mania de arrumação é invadido por meia dúzia de pinguins barulhentos e baderneiros. Um cenário indubitavelmente propício para muitas gargalhadas.

Nos últimos estudos realizados, o achado típico é o de que três quartos dos pares pai-bebê compartilham a mesma categoria de apego (van Ijzendroorn, 1995, 1997). No filme, podemos afirmar categoricamente, que o Sr. Popper estava reproduzindo o mesmo tipo de relação que recebeu de seu pai com os seus dois filhos. Com o presente deixado por seu pai as coisas foram se modificando em ritmo veloz. Os pinguins eram engraçadinhos, exigiam atenção e faziam companhia. O Sr. Popper estava experimentando viver em uma família, inevitavelmente todos os seis bichinhos se apegaram a ele, até pelo fato do personagem sempre se vestir com ternos pretos. Em contrapartida, os filhos desejavam a companhia do Sr. Popper como nunca antes e nesse momento do filme até as cores eram alegres e vivas, havia um playground glacial dentro do não mais gélido apartamento.

Os relacionamentos se estreitaram ainda mais com risos, abraços e palavras de afeto e encorajamento. Um animal do gelo sendo o pivô de uma “quebra de gelo” sem precedentes. Vínculos afetivos e apegos seguros se estabeleciam em todos os níveis. Entre os pingüins e os humanos, entre os filhos e o pai, entre a esposa e o marido que se encontravam separados. Todos eram alcançados e abarcados nesse novo cenário de tempo e amor disponibilizados um para o outro. Os pinguins tiveram bebês e os sentimentos de empatia, amor, afeto, cuidado e preocupação faziam parte, pela primeira vez da vida do Sr. Popper, para todos ao seu redor.

O pai do Sr. Popper havia mandado uma carta junto do presente, e, por uma daquelas conhecidas coincidências de filme, a carta foi parar debaixo do móvel. Em um momento de hesitação do personagem, em que ele deixa os pinguins irem ao zoológico e volta à rotina monocromática, ele lê o bilhete, no qual seu pai diz: “os pinguins sabem amar como ninguém, coisa que ele nunca aprendeu a demonstrar” e sugere ao Sr. Popper que passe com os seus filhos todo o tempo que puder, afirmando que ele ainda pode fazer isso e se desculpando por não ter entendido a importância dos alimentos afeto, amor e tempo antes. Termino por aqui, não vou contar o final do filme com a intenção de que você pegue seu filho e passe uma tarde maravilhosa com ele, incluindo nesse passeio, porque não, a ida ao cinema para conhecer o papai Popper e seus pinguins.

Referências bibliográficas:
Bee, Helen L. (2011). A crianca em desenvolvimento. Trad.: Cristina Monteiro. Porto Alegre, RS: Artmed, 12ª ed.
Filme “Os Pinguins do Papai” (2011)

VIPs: Vendo uma Infância Perdida (46ª)

Os últimos três filmes que vi têm pelo menos um ponto em comum: a infância dos personagens principais. A des-estrutura da construção familiar de cada um.

Em cisne negro a jovem protagonista é vítima da obsessão da mãe que se projeta de forma doentia na filha. Já em bruna surfistinha a rejeição a perseguiu desde pequena. Uma criança adotada. Uma jovem com dificuldades de adequação com os pais, irmão e colegas de classe. Em VIPs não é diferente, a alienação da mãe e o misto de ausência e cobrança doentia por parte do pai construiu um garoto sem identidade e senso de direção.

Três histórias. Contextos diferentes, países diferentes, momentos diferentes. Um resultado igualmente trágico e cruel.

 A bailarina é tão pressionada que se funde com o personagem ao ponto de tirar a própria vida. A Raquel se lança nos braços de todo e qualquer tipo de homem com o desejo propulsor de enfim ser amada e não somente rejeitada. Marcelo está preso, vivendo atrás das grades. Sonhos interrompidos. Esperanças abortadas. Destinos roubados.

Para alguns parece maniqueísmo. Para mim vem como um absoluto: o papel determinante dos pais na vida de uma criança. A afetividade como arma contra a psicose social instalada em nossos dias.

 



Pai, venha com o Teu Reino sobre a nossa paternagem. Torna-nos pais e mães que refletem quem tu és para os nossos filhos. Tenha misericórdia de nós. Sozinhos não conseguiremos… 

127 horas (28º)

Acabei de chegar do cinema e estou tensa, preciso escrever. Fui ver o azarão do oscar, o filme 127 horas. Claustrofóbico, quente, engraçado, tenso, denso, light, angustiante, dolorido, extasiante, divertido, rápido, lento, bonito, feio e tantas outras coisas que não consigo dimensionar por palavras. Isso tudo em um filme só. Não estou querendo gerar falsas expectativas em ninguem. Quero deixar claro que relato a minha opinião pessoal, redundante de propósito. Uma hora e meia de filme, dia útil, meio da tarde, cinema com papai, pagando meia com estacionamento grátis. Perfeito. Não sei o que a galera especializada está falando, mas não consigo tirar da cabeça a palavra referencial desde que sair do cinema. Quando um referencial muda TUDO se altera. A proposta para nós é um referencial de eternidade. Imagina só o que seria viver assim. Suspirei alto agora. Gastaríamos a nossa energia de outra forma, ações, palavras, gestos, tempo, dinheiro, afeto, escala de prioridades. Absolutamente tudo seria alterado. O filme deve ter custado bem pouco. Mais de uma hora dele se passa no mesmo cenário e isso pra mim é fantástico. Não aguento mais esses milhões hollywoodianos investidos em efeitos, locações e toda parafernália. Filme nada apelativo. Talvez um pouco exagerado em alguns momentos. Mas até os exageros recebi de muito bom grado. Por exemplo, a última molécula de água caindo na garganta do Aron ou o canivete tocando o osso. Não quero comprometer o filme e sim colocar uma puguinha aí para que você pare a sua rotina esmagadora e vá ao cinema. Valeu muito a pena para mim e vai ser ótimo para você. O que posso adiantar é que você sairá de lá com muito mais vontade de viver. E sobre a minha companhia só posso dizer Abba Pai!! Não deixe que essa questão de referencial alterado seja uma bela teoria na minha vida… Mesmo que tenha que amputar algo… Ai! Acho que ainda não estou certa disso. Thanks, Dad!